Manifesto
Perante um cenário alarmante de gestão inadequada de faixas e mosaicos de gestão de combustível e de completo desrespeito pelo património natural em Portugal, diversas associações e cidadãos em nome individual uniram-se para formar um grupo de trabalho dedicado à reforma das práticas que constam na legislação que implementa o Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais. Esta iniciativa propõe uma abordagem mais sustentável e alinhada com a conservação dos ecossistemas e da paisagem.
O problema
As regras de funcionamento do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais, em particular no que respeita às atuais normas técnicas de gestão de combustível nas faixas de gestão de combustível das redes primária, secundária e terciária e nas áreas estratégicas de mosaicos de gestão de combustível, não consideram critérios ambientais rigorosos nem promovem enquadramento com outras prioridades existentes, levando a intervenções contraproducentes e a graves impactes ecológicos. Desde a sua implementação, são já inúmeros os casos identificados de corte excessivo de vegetação arbórea e arbustiva, com efeitos negativos nas paisagens e trazendo outras consequências nefastas para as localidades e populações.
Esta situação tem levado à degradação da orla florestal, proliferação de espécies invasoras, perda de biodiversidade, redução das já diminutas áreas em bom estado de conservação, aumento da erosão e perda da identidade cultural da paisagem. Há uma clara ambiguidade nas diretrizes e falta de fiscalização da correta aplicação destas. As regras são demasiado gerais e acabam por ser interpretadas de maneiras diferentes por diversas entidades. Existe uma notável falta de monitorização e fiscalização das faixas, sem punição para más práticas, mesmo quando se removem espécies protegidas e afetam habitats florestais sem a devida aprovação prévia pelo ICNF.
A constante ameaça de multas e o receio de consequências futuras em eventuais incêndios levam cidadãos e entidades a realizar intervenções excessivas, privilegiando soluções de baixo custo, danificando estruturalmente o terreno e muitas vezes afetando-o de tal modo que deixa de poder suportar qualquer tipo de vegetação além de espécies invasoras que aí encontram condições favoráveis para se instalarem e propagarem.
O critério das faixas com copas a 4 metros, mesmo em bosques nativos de folhosas, promove a destruição de centenas de hectares dessas raras áreas de floresta, importantíssimas para a biodiversidade. Os bosques que resistiram aos grandes incêndios do passado, quer pela sua proximidade a povoações e vias de comunicação quer por se localizarem em bolsas isoladas atravessadas por linhas elétricas, estão a ser destruídos pela aplicação cega dos critérios vigentes. Muitas vezes, a abertura agressiva de caminhos e desbastes excessivos debilitam a estrutura florestal, e muitas das árvores restantes acabam por ser derrubadas pelo vento, consumando a destruição da área.
Por outro lado, estes mesmos bosques não só provam ser ecossistemas que albergam uma biodiversidade importantíssima para o país, como também, com base na informação disponibilizada pela comunidade científica, podem ser os nossos melhores aliados no combate aos fogos rurais. Bosques de folhosas bem desenvolvidos proporcionam áreas sombreadas que retêm a humidade, inibem a proliferação de combustíveis finos e mais inflamáveis, e podem servir de barreira à passagem do fogo. Em vez de criar clareiras, é necessário adensar e promover o ensombramento.
O Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais (SGIFR) acaba por contribuir para a contínua degradação das nossas florestas do ponto de vista ecológico. Esta situação seria evitável com ligeiras mudanças na legislação vigente. É imperativo que tomemos medidas urgentes e assertivas para proteger as nossas florestas e garantir um futuro mais sustentável para Portugal.
Declaração de Princípios
Preservação da Biodiversidade: Defendemos a manutenção e proteção da biodiversidade, em especial nas áreas classificadas (Áreas Protegidas, Rede Natura 2000, Sítios Ramsar), que estão a ser injustamente sacrificadas em nome de uma suposta prevenção de incêndios.
Sustentabilidade Ambiental: Comprometemo-nos a promover práticas de gestão de combustível que respeitem os ciclos naturais e a integridade ecológica das paisagens.
Transparência: Asseguramos um processo transparente e inclusivo, envolvendo cidadãos, especialistas e entidades não-governamentais na criação de soluções eficazes e justas.
Inovação e Adaptação: Incentivamos a investigação de métodos inovadores e adaptados regionalmente que protejam tanto as pessoas quanto os ecossistemas.
Educação: Comprometemo-nos a sensibilizar o público e os decisores políticos sobre a importância de uma gestão de combustíveis que esteja alinhada com a preservação ambiental.
Objetivos:
Aumentar o papel ativo da sociedade civil na definição de metas e prioridades relativas à gestão de fogos rurais em Portugal.
Rever e contestar as políticas e planos existentes que levam ao abate indiscriminado de árvores e degradação de habitats em bom estado de conservação.
Promover alternativas sustentáveis ao atual modelo de gestão de combustíveis que considerem a proteção ecológica e a redução do risco de incêndios.
Estabelecer diálogo e colaboração entre a sociedade civil, entidades privadas e o setor público para a implementação de práticas sustentáveis.
Monitorizar e reportar práticas de gestão de combustíveis, tanto corretas como incorretas.
O nosso Compromisso
Este manifesto serve como um compromisso de lutar pela reforma das práticas de gestão de combustíveis e pela proteção do nosso valioso património natural.
O que exigimos:
A revisão e urgente publicação do novo regulamento relativo às normas técnicas de gestão de combustível nas faixas de gestão de combustível das redes primária, secundária e terciária e nas áreas estratégicas de mosaicos de gestão de combustível, que segundo o n.º 3 do Artigo 78.º no Decreto-Lei n.º 82/2021, de 13 de outubro, estava previsto que fosse publicado pelo ICNF, no prazo máximo de 60 dias contados a partir da publicação da referida legislação, o que não aconteceu até ao momento.
A alteração do novo regulamento relativo às normas técnicas de gestão de combustível nas faixas de gestão de combustível das redes primária, secundária e terciária e nas áreas estratégicas de mosaicos de gestão de combustível, deve ter em conta:
A eliminação da obrigatoriedade de cortar arvoredo adulto de folhosas autóctones, exceto quando exista a necessidade de promover a remoção e/ou de controle periódico de espécies exóticas invasoras;
a clarificação da definição do que são núcleos de arvoredo que se revistam de interesse silvícola, biológico ou paisagístico, como tal identificados pelas autoridades competentes ou pelos instrumentos de gestão territorial, de acordo com o estipulado no n.º 3 do Artigo 14.º da Lei n.º 34/2015, de 27 de abril (aprova o novo Estatuto das Estradas da Rede Rodoviária Nacional);
a inclusão de bosques de folhosas, entre outros habitats de características florestais autóctones, como uso compatível em faixas de gestão de combustível;
a salvaguarda de bosques ripícolas e outros habitats de características florestais autóctones com baixa representatividade no território nas faixas de gestão e áreas estratégicas de mosaicos de gestão de combustível.
Que a nova regulamentação seja sujeita a consulta pública por parte da sociedade civil.
Uma cultura de respeito pela legislação em vigor - e pela biodiversidade e pelos ecossistemas - por parte das entidades que são obrigadas a efetuar a gestão de combustível em infraestruturas que se inserem na rede secundária de faixas de gestão de combustível, admitindo-se a introdução de contraordenações muito graves para quem realize cortes injustificados e que não estejam de acordo com o que venha a ser definido no novo regulamento relativo às normas técnicas de gestão de combustível nas faixas de gestão de combustível das redes primária, secundária e terciária e nas áreas estratégicas de mosaicos de gestão de combustível.
O grupo compromete-se a elaborar uma proposta detalhada, fundamentando os pontos acima mencionados no que toca às mudanças das normas técnicas, para as entidades competentes.
Quer ajudar? Junte-se ao movimento.
Não perca os próximos passos e junte-se a nós para transformar a prevenção de incêndios, em colaboração com a natureza. Cada um de nós pode fazer a diferença.
Juntos pela reforma ecológica do Sistema de Gestão Integrada de Fogos Rurais
© 2024. Todos os direitos reservados.
Em colaboração com: